A classificação de hotéis entre uma e cinco estrelas deve acabar no Brasil. É o que prevê o Ministério do Turismo, único órgão autorizado a dar esse tipo de nota a meios de hospedagem no país.
Desde 2016, estão suspensas a emissão e a renovação dos certificados. Isso significa que nenhum hotel inaugurado depois dessa data tem de fato estrelas —ainda que ostente os símbolos em uma placa na recepção ou em sua página na internet.
O ministério chegou à conclusão de que o atual sistema de classificação, cuja adesão era opcional, não atende mais às demandas dos hóspedes nem da iniciativa privada.
“O SBClass (Sistema Brasileiro de Classificação dos Meios de Hospedagem) está sendo reestruturado para se adaptar à nova realidade do mercado, em que consumidor e empresas estabelecem um canal direto de comunicação por meio das plataformas digitais”, diz o órgão, em nota.
De acordo com o ministério, a ideia é que os critérios do SBClass passem a servir apenas como orientação ao setor hoteleiro, e, assim, as estrelas deixem de ser marca exclusiva do governo federal.
“Isso não está errado, mas o órgão estará se eximindo de uma responsabilidade que sempre foi da autoridade nacional de turismo”, afirma a pesquisadora Mariana Aldrigui, professora do curso de turismo da USP (Universidade de São Paulo).
O discurso de que o ministério vai passar de classificador a orientador, de acordo com ela, esconde a real razão para a mudança: a falta de orçamento da pasta e de equipe para dar conta de fiscalizar todos os hotéis do país.
Para o presidente da Abih (Associação Brasileira da Indústria de Hotéis), Manoel Linhares, a classificação oficial por estrelas é boa para o setor, porque oferece maior segurança ao hóspede.
Mas, no mundo todo, ela vem perdendo espaço para as notas e resenhas publicadas por viajantes em sites de avaliação de hotéis e serviços.
Antes da internet, fazia sentido que um técnico se deslocasse até um estabelecimento para classificá-lo, já que o turista contava com poucas informações na hora de escolher a hospedagem. As estrelas pelo menos davam a ele alguma noção de quais níveis de estrutura e de serviços encontraria pela frente.
Hoje, o hóspede pode fazer essa pesquisa sozinho, nos sites dos próprios hotéis e nas plataformas de avaliação.
“A experiência de quem efetivamente se hospedou no lugar tem muito mais veracidade do que um parecer técnico”, diz Trícia Neves, sócia-diretora da consultoria Mapie, especializada em turismo.
Isso faz com que o viajante possa chegar pela primeira vez a um hotel, por exemplo, e já dizer que não quer ficar em um apartamento com janela para a lateral do prédio porque, pela resenha que leu, sabe que a vista não é bonita. “Essas informações, as estrelas não conseguem dar”, afirma Neves.
O risco, porém, é de encontrar pelo caminho avaliações falsas ou mal intencionadas. O caso mais emblemático é do estabelecimento que, sem nunca ter existido, chegou ao topo do ranking dos melhores restaurantes de Londres no TripAdvisor. Fazia parte de uma experiência de um jornalista britânico para expor as fragilidades da plataforma.
“Mas esse é um exemplo sui generis, porque anunciava uma experiência secreta e apelava para um público específico, que valoriza muito o que é exclusivo”, afirma Aldrigui, da USP.
Os sites dizem investir em sistemas de rastreamento de resenhas falsas. O próprio TripAdvisor afirma que trabalha para detectar avaliações inverídicas, sejam pagas, feitas por pessoas que tenham ligação com os estabelecimentos ou que, ao contrário, pertençam à concorrência.
Além de servir de guia para os consumidores, esses sites de avaliação também mudaram a dinâmica do setor hoteleiro. Muitas redes, inclusive, já condicionam o reconhecimento, financeiro ou não, de seus funcionários às notas obtidas nessas plataformas.
Afinal, trata-se de um serviço de monitoramento de qualidade praticamente gratuito e bem mais eficaz que o bom e velho formulário de papel. Para gerenciá-lo, só precisa de um profissional que analise e responda às críticas com atenção e agilidade.
Mas, apesar de tudo isso, é inegável que o padrão cinco estrelas ainda significa muito para boa parte dos consumidores em diferentes países. Tanto é assim que alguns hotéis de luxo pelo mundo se anunciam, inclusive, com ainda mais estrelas.
“Todas as classificações oficiais vão até cinco estrelas”, afirma Antônio Carlos Bonfato, professor do curso de graduação de tecnologia em hotelaria do Centro Universitário Senac. “Falar que se tem seis ou sete estrelas é só uma jogada de marketing.”
COMO SÃO FEITAS AS AVALIAÇÕES
BOOKING
Só clientes que fizeram a reserva do hotel pela plataforma podem avaliá-lo —o que reduz o risco de falsas resenhas. A nota é calculada pelo sistema, não pelo usuário, a partir das respostas de um questionário com itens como wi-fi e conforto
TRIPADVISOR
Recebe avaliações de forma espontânea, sem comprovação de que o autor do comentário no site se hospedou no estabelecimento. O usuário dá uma classificação, que vai de “horrível” a “excelente”, para atendimento, quartos, custo-benefício e para o hotel no geral
DECOLAR
Cada usuário, que de fato fez a reserva pela plataforma, dá uma nota para o estabelecimento em relação a vários aspectos. A nota final apresentada no site é calculada por meio de uma fórmula que privilegia as avaliações mais recente
HOTEIS.COM
Oferece dois formatos de avaliação dentro da plataforma: a do TripAdvisor e a que é chamada de “avaliações genuínas de hóspedes da Hoteis.com”. Mostra a nota média das avaliações para limpeza, atendimento, conforto, condições e localização
Fonte: Folha de S. Paulo