1) Em razão da sanção da Lei, que trouxe nova regulamentação para as gorjetas recebidas pelos empregados em hotéis, restaurantes, bares e similares, houve alteração na natureza jurídica da verba?
R: Não. O caput do artigo 457 da CLT não foi alterado. Portanto, foi mantida a natureza jurídica remuneratória das gorjetas. Elas não passaram a ser consideradas como salário dos empregados.
2) Enquanto parte integrante da remuneração dos empregados, quais encargos incidem sobre as gorjetas e que devem ser pagos pelas empresas?
R: Sobre as gorjetas apenas devem ser calculados e pagos o 13º salário, as férias com o terço constitucional, o FGTS e as contribuições previdenciárias. De acordo com o Enunciado 354, do TST: “As gorjetas, cobradas pelo empregador na nota de serviço ou oferecidas espontaneamente pelos clientes, integram a remuneração do empregado, não servindo de base de cálculo para as parcelas de aviso-prévio, adicional noturno, horas extras e repouso semanal remunerado”.
3) Os empregados que recebem gorjetas devem ser tributados?
R: Sim. As gorjetas recebidas pelos empregados devem ser tributadas na fonte pelo INSS (alíquotas de 8%, 9% ou 11%) e também pelo Imposto de Renda, de acordo com a tabela progressiva. O empregador deverá efetuar a retenção na fonte desses dois tributos sobre a remuneração (salário mais gorjetas) do empregado e repassá-los ao fisco.
Além disso, a Contribuição Sindical, também incide sobre as gorjetas, conforme o parágrafo segundo do artigo 582 da CLT. Há disposição na CCT do SINTHORESP determinando a incidência das Contribuições Assistenciais sobre estimativa de gorjetas, mas não sobre as gorjetas pagas em holerite Os empregados podem se opor aos descontos das Contribuições Assistenciais.
Se houver determinação de algum juiz de família para desconto de pensão alimentícia sobre a remuneração do empregado, as gorjetas ainda deverão ser levadas em consideração. Isso não ocorrerá se a ordem for para desconto apenas sobre o salário.
4) A nova regulamentação obriga os restaurantes e similares a cobrarem as gorjetas de forma compulsória nas notas de despesas (pré-contas)?
R: Não, de forma alguma. As gorjetas poderão continuar a ser espontâneas ou cobradas como adicionais nas notas de despesas entregues aos clientes (pré-contas).
5) Então, afinal, o que mudou?
R: A grande mudança está no conceito que a nova legislação pretendeu dar às gorjetas espontâneas, considerando-as como tais apenas aquelas que são efetivamente entregues diretamente pelos clientes aos empregados dos restaurantes e similares. Percebe-se que a nova legislação, ao ser interpretada de forma sistemática, deixa de considerar como espontâneas as gorjetas que transitam pelo caixa da empresa, concedidas por meio de cheques, cartões de crédito ou débito. Somente aquelas deixadas pelos clientes em dinheiro diretamente aos empregados dos restaurantes e similares seriam consideradas espontâneas.
6) Diante desse quadro, qual seria o melhor procedimento a ser adotado pelo restaurante que aceita cheques, cartões de crédito ou débito para o recebimento de gorjetas?
R: Seguindo o que determina a nova legislação, o procedimento indicado para esse estabelecimento será o de efetivamente lançar nas notas de despesas (pré-contas) entregues aos seus clientes os valores das gorjetas sugeridas, receber as quantias respectivas, administrá-las e pagá-las aos seus empregados nos holerites.
7) Mas, ao seguir esse procedimento, o restaurante não sofreria um enorme aumento de custos, por conta dos encargos incidentes sobre as gorjetas?
R: Não tanto. A nova legislação permite às empresas reterem parte das gorjetas arrecadadas para custearem os encargos trabalhistas (13º salário e férias), fundiários (FGTS) e, conforme o seu regime tributário, previdenciários (INSS) incidentes sobre elas. Para as empresas enquadradas no SIMPLES, isentas das contribuições previdenciárias sobre a folha, é permitida a retenção de até 20%. Aquelas tributadas pelos regimes do Lucro Real ou Presumido podem reter até 33%.
8) Haveria ainda outras considerações sobre custos?
R: Sim. Em nenhuma das hipóteses acima estão computados os dispêndios maiores que as empresas passariam a ter com as multas rescisórias do FGTS. Com as gorjetas incorporadas à remuneração, os depósitos fundiários aumentam e, por conseguinte, as multas devidas em dispensas sem justa causa igualmente crescem. Por outro lado, também não está computada em nenhuma das hipóteses acima a economia que as empresas teriam com a eliminação da tabela de estimativa de gorjetas. A partir do momento em que a empresa passar a arrecadar e distribuir as gorjetas em holerite, desaparece para ela a obrigatoriedade de continuar a fazer uso das tabelas de estimativa de gorjetas para fins de cálculo e pagamento de encargos sobre as gorjetas. Tais tabelas tinham sua razão de existir enquanto a empresa não podia precisar quanto cada empregado recebia por mês de gorjetas.
9) Além do aumento da multa de 40% do FGTS, as rescisões trabalhistas não ficariam mais onerosas por conta da incorporação das gorjetas?
R: Não. Como visto acima, as gorjetas não servem de base de cálculo para o aviso prévio indenizado. Além disso, as férias e 13º salário devidos na rescisão seriam cobertos com a retenção permitida pela nova legislação.
10) E os processos trabalhistas não terminariam ficando mais caros, em razão da incorporação das gorjetas?
R: Também não. Eventuais horas extras, adicionais noturnos e DSR a que as empresas vierem a ser condenadas em ações trabalhistas continuarão a ser calculados exclusivamente sobre os salários dos empregados, sem a incorporação das gorjetas.
Ressalte-se que as gorjetas não servem de base de cálculo para:
- Horas Extras;
- Adicional Noturno;
- Descanso Semanal Remunerado; e
- Aviso Prévio.
As parcelas acima devem ser calculadas e pagas exclusivamente sobre os salários. Por exemplo, se determinado empregado perceber R$ 880,00 de salário e R$ 1.000,00 de gorjetas, eventual hora extra prestada será paga à razão de R$ 4,00 (R$ 880,00 / 220) mais o respectivo adicional. As gorjetas, frise-se, não entram no cálculo.
11) Com a implantação do novo regime de gorjetas, os empregados não acabariam tendo seus ganhos diminuídos?
R: Sem dúvida que sim. Além das retenções (de 20% ou 33%, conforme o caso), os empregados, como visto acima, passariam a sofrer a tributação na fonte pelo INSS e, eventualmente pelo Imposto de Renda.
Será importante, nesse sentido, que o empresário exponha aos seus empregados que essa diminuição nos seus ganhos é, de certa forma, compensada com maiores férias e 13º salário, FGTS encorpado e melhores benefícios previdenciários (auxílio-doença, auxílio-acidentário e aposentadoria). Além disso, os empregados passarão a contar com comprovantes de rendimentos que lhes permitirão comprar a crédito com maiores facilidades.
O 13º salário sobre as gorjetas também poderá ser pago todo mês de forma destacada no holerite, o que incrementa o rendimento mensal do empregado. Por exemplo, se a gorjeta de determinado empregado em março for de R$ 1.000,00, a empresa paga neste mesmo mês mais R$ 83,00 (8,3%) a título de 1/12 de 13º salário.
O restaurante poderá, finalmente, passar a sugerir um percentual de gorjeta superior aos usuais 10%, tais como 11%, 12%, 13% ou mais. Com isso, naturalmente, aumenta-se o montante de gratificações destinadas aos empregados.
12) É legal cobrar taxa de serviço maior do que 10%? A nova legislação traz alguma disposição acerca do percentual que pode ser cobrado?
R: Não existe nenhuma lei federal proibindo a cobrança de “taxa de serviço” obrigatória, nem tampouco determinando o percentual que pode ser cobrado como adicional das notas de despesas. A nova legislação também não fala nada a respeito. Não obstante, a ausência de disposição legal federal, recomenda-se que as gorjetas não sejam cobradas de forma obrigatória, mas apenas sejam sugeridas nas pré-contas entregues aos clientes. Isso para evitar problemas com os próprios clientes e órgãos de proteção do consumidor (PROCONS).
Quanto ao percentual, desde que as gorjetas sejam sugeridas, não há, a princípio, problema na sugestão de gorjetas de 11%, 12%, 13% ou mais. A brigada deve ser instruída a não constranger ou “criar caso” com o cliente que queira gratificar os empregados com percentuais inferiores aos sugeridos ou mesmo não conceder a gorjeta.
13) Como ficaria, então, a pré-conta?
R: A PRÉ-CONTA apresentada ao cliente, a partir da nova lei, pode e deve discriminar o valor da gorjeta sugerida. Dizemos sugerida porque, para os órgãos de proteção e defesa do consumidor (PROCONS), o serviço não pode ser obrigatório. Papéis grampeados com valor do serviço e outros modos de sugestão de gorjeta (calculadoras, post-it etc.) elaborados pela brigada devem ser abandonados. Abaixo exemplo de como ficaria a PRÉ-CONTA:
RESTAURANTE ABC LTDA
PRÉ-CONTA
2 Refeições……………………………………………..R$ 80,00
2 Bebidas……………………………………………….R$ 20,00
SUB-TOTAL……………………………………………R$ 100,00
GORJETA SUGERIDA…………………………….R$ 10,00
TOTAL……………………………………………………R$ 110,00
14) E o cupom fiscal?
R: No CUPOM FISCAL, a gorjeta também deve passar a ser devidamente discriminada com a sua efetiva nomenclatura. Ou seja, não devem mais ser utilizados termos como Troco ou Acréscimo. Ao final do cupom, é aconselhável a inserção de texto sobre a Nota Fiscal Paulista. O valor da gorjeta a ser discriminado no cupom fiscal será aquele que efetivamente o cliente conceder aos empregados do restaurante. Segue, nesse passo, exemplo de CUPOM FISCAL:
RESTAURANTE ABC LTDA
CUPOM FISCAL
2 Refeições………………………………………………R$ 80,00
2 Bebidas…………………………………………………R$ 20,00
SUB-TOTAL……………………………………………..R$ 100,00
GORJETA EFETIVAMENTE CONCEDIDA….R$ 10,00
TOTAL……………………………………………………..R$ 110,00
-A GORJETA É ISENTA DO ICMS E NÃO GERA CRÉDITO
AO CLIENTE QUE SOLICITA A NOTA FISCAL PAULISTA
15) E os holerites?
R: As gorjetas arrecadadas pelo restaurante deverão ingressar integralmente no caixa da empresa. O empregador cuidará de administrar e ratear as gorjetas entre os seus empregados, pagando-as mensalmente em holerite, juntamente com os salários, após a dedução do porcentual de 20% ou 33%, conforme o caso. No holerite, esse componente da remuneração entrará como um item à parte e específico sob a rubrica de GORJETAS.
A soma do Salário Base com as GORJETAS recebidas no respectivo mês de competência constitui a remuneração do empregado sobre a qual incidem:
– Os depósitos do FGTS; e
– As contribuições devidas ao INSS e terceiros (SESC, SENAC, Salário Educação, RAT, SEBRAE etc).
As empresas inscritas no SIMPLES são isentas do recolhimento das contribuições ao INSS e terceiros sobre as gorjetas. Na CTPS do empregado deverá ser anotado o salário e as gorjetas por ele recebidas.
16) E o 13º salário e as férias?
R: No final do ano, as empresas deverão pagar o 13º salário de seus empregados, levando em consideração a média das gorjetas recebidas nos últimos 12 meses ou periodicidade inferior na impossibilidade de se computar esse tempo. Essa é a regra vigente em São Paulo, tanto na Convenção Coletiva firmada pelo SINTHORESP quanto pelo SINDIFAST. Tal regramento poderá ser diferente em outras localidades
ou no futuro vir a ser modificado. O 13º salário sobre as gorjetas também poderá ser pago todo mês de forma destacada no holerite, o que incrementa o rendimento mensal do empregado. Por exemplo, se a gorjeta de determinado empregado em março for de R$ 1.000,00, a empresa paga neste mesmo mês mais R$ 83,00 (8,3%) a título de 1/12 de 13º salário.
Quando determinado empregado sair de férias, ele receberá as férias com base também nas gorjetas, cabendo ao empregador lhe pagar, em holerite, o terço constitucional.
17) Quais são os procedimentos para a implantação da modalidade de gorjeta prevista na nova legislação?
R: Em primeiro lugar, a empresa deve verificar se a Convenção Coletiva aplicável na sua localidade permite a adoção do regime, principalmente no que se refere à possibilidade de retenção de percentuais para cobertura de encargos. Em São Paulo e região, as Convenções Coletivas do SINTHORESP e do SINDIFAST admitem essa possibilidade. Apenas o percentual de retenção de 35% deverá ser em breve ajustado para 33%.
A seguir, a empresa deverá procurar o Sindicato Profissional local e formalizar Acordo Coletivo ou Termo de Implantação das gorjetas, a fim de fixar os critérios de rateio e distribuição das gorjetas, assim como criar a comissão de empregados que será responsável pela fiscalização da distribuição das gorjetas.
18) E se na Convenção Coletiva local não houver previsão dessa modalidade de gorjetas?
R: Nesse caso, o Acordo Coletivo que a empresa vier a celebrar também deverá dispor acerca da possibilidade de efetuar as retenções de percentuais para cobertura dos encargos. Sem a previsão em Convenção Coletiva ou em Acordo Coletivo não é possível efetuar tais retenções. A nova legislação diz que as retenções (de até 20% ou de até 33%) dependem de expressa previsão em norma coletiva de trabalho.
19) A cozinha e demais empregados do restaurante também podem participar do rateio das gorjetas?
R: Não só podem como devem e provavelmente os sindicatos exigirão que parte das gorjetas seja destinada aos empregados da cozinha e em outras funções, que não as de atendimento.
20) E os critérios de pontuação?
R: Os critérios de pontuação devem ser definidos no Acordo Coletivo ou no Termo de Implantação das gorjetas.
21) Os membros da comissão de fiscalização terão estabilidade no emprego?
R: Nas empresas com mais de 60 empregados, os membros da comissão de fiscalização terão estabilidade no emprego, enquanto estiverem eles no exercício do encargo fiscalizatório. A lei não diz quantos devem ser os membros da comissão de fiscalização.
22) Não haverá mais processos trabalhistas sobre as gorjetas?
R: Haverá. Porém, o foco das ações será outro. Os processos passarão a versar sobre a incorreção dos repasses das gorjetas. Por isso, será fundamental que as empresas tenham condições de mostrar documentalmente que as gorjetas, após as deduções permitidas em lei, sempre foram corretamente repassadas aos empregados. A comissão de fiscalização deverá vistar os documentos de controle de arrecadação e repasse das gorjetas e concordar com os seus termos.
23) O restaurante que sempre cobrou ou admitiu que seus empregados recebessem gorjetas poderá deixar de fazê-lo?
R: Poder pode. Mas não deve. A lei diz que, nessa hipótese, o empregador deverá incorporar nos salários de seus empregados a média das gorjetas recebidas nos últimos 12 meses.
24) E os tributos sobre as gorjetas?
R: Em vários Estados, inclusive São Paulo, há isenção de ICMS sobre as gorjetas até o limite de 10%. Em termos federais, existe apenas uma resolução, em nossa opinião ilegal, determinando a inclusão das gorjetas na base de cálculo do SIMPLES. Não há normas federais tratando especificamente do PIS, COFINS, IRPJ e CSSL sobre as gorjetas.
A jurisprudência, por sua vez, é amplamente favorável aos contribuintes nesse aspecto. Existem diversas decisões judiciais, inclusive do STF e STJ, no sentido de que, por não fazerem parte do faturamento da empresa e constituírem remuneração dos empregados, sobre as gorjetas não podem incidir tributos cuja base de cálculo seja a receita bruta da empresa, tais como PIS, COFINS, IRPJ e CSSL. Nesse particular, a nova legislação é favorável às empresas, quando ela determina que as gorjetas não constituem receita própria dos empregadores.
25) E os aluguéis?
R: As empresas deverão ter o cuidado de nos seus contratos de locação, cujos aluguéis são calculados sobre o faturamento, excluírem expressamente da base de cálculo dos valores locatícios as gorjetas cobradas como adicionais das notas de despesas.
26) Quando a nova legislação entra em vigor?
R: Está em vigor desde 13 de maio de 2017.
Clique aqui para conferir o texto sobre a não revogação da Lei 13.419/17 (Lei das Gorjetas)!