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CEO da Accor: ‘Turistas que não irão ao exterior podem salvar hotéis no Brasil’

Um dos setores mais afetados durante a pandemia foi o hoteleiro, que dependia diretamente de viagens e turismo. Em 2019, o movimento dos hotéis representava 8,1% do PIB brasileiro, mas com a crise, a perda já supera os R$ 14 bilhões.

Apenas na pandemia, a taxa de ocupação dos hotéis brasileiros caiu 96% e, segundo projeções do setor, a retomada deve levar no mínimo 18 meses.

No “novo normal’”, o consumidor não será mais o mesmo, ou viajar como antes. Pesquisas revelam que o turismo internacional deve ficar travado, dando lugar ao nacional. Os executivos que na quarentena descobriram o poder das reuniões virtuais também podem mudar o formato das viagens.

Mas como em toda crise, enquanto uns choram, outros vendem lenços. No Conta+ de hoje, Katherine Rivas entrevistou Patrick Mendes, CEO da Accor na América do Sul. A rede que é dona dos hotéis Ibis, Novotel, Pullman e Mercure, criou recentemente o room-office, uma estratégia que transformou quartos e hotéis em escritórios individuais para vender o “home office” ideal. Confira:

InvestNews – Você defende que em um cenário pouco otimista a recuperação do setor hoteleiro acontece em 18 meses. Qual é a previsão da Accor para retomar as atividades?

Patrick Mendes – Nós passamos a fase mais difícil da crise, eu diria que estamos no ‘pós-tsunami’. Os meses de abril, maio e junho são os mais complexos, porque os hotéis estavam fechados e houve uma queda violenta da ocupação. Agora estamos na 2ª fase, desde o dia 20 de maio, quando começamos a reabrir hotéis. Dos 400 hotéis que temos na América do Sul, tínhamos 100 abertos. Esta semana reabrimos 25 hotéis, sendo 20 no sul do Brasil. Estamos em uma fase de reabertura econômica. Até fim de junho teremos 240 hotéis abertos, que é 60% da nossa operação na América Latina. E até o fim de julho, chegaremos a 300 hotéis abertos. Nossa previsão de desempenho é que o ano completo de 2020 seja equivalente a metade de 2019. Essa é nossa realidade com a queda violenta do 2º trimestre. Mesmo com um retorno no 3º trimestre e um retorno mais forte ainda no 4º, 2020 será a metade que 2019. Em 2021, a nossa previsão para o Brasil é chegar no 4º trimestre de 2021, com desempenho equivalente ao 4º trimestre de 2019. Por isso que a projeção aponta 18 meses.

É inegável que o consumidor deve mudar os hábitos quando falamos de turismo. Há debates que após a pandemia o turismo doméstico deve crescer, enquanto os executivos que viajavam com muita frequência devem encontrar outras formas de se reunir, por exemplo videoconferências. Como vocês vão se adaptar a este novo comportamento do consumidor?

Vemos várias tendências que estão se destacando de forma clara, nos países que estão reabrindo a economia. A primeira tendência forte é o turismo doméstico. E no Brasil isso vai ocorrer por várias razões: 1) Você não vai poder viajar tão cedo para o exterior, por causa das restrições sanitárias, bloqueio de fronteiras. E quem tem a possibilidade, não vai querer arriscar de ficar em quarentena quando voltar da viagem. 2) O dólar e o euro estão muito caros, viajar para o exterior custa 40% a mais para um brasileiro ou latino-americano do que viajar na América do Sul. 3) As pessoas não querem ficar muito longe das famílias, então não arriscariam ficar 20 dias em Dubai, por exemplo.

Então o primeiro a retomar é o turismo doméstico, inicialmente com viagens de carro e depois de avião. Mas isso não é ruim para nós. Olhando de perto, temos cerca de 100 milhões de turistas no Brasil, 94% destes são brasileiros e apenas 6%, que equivale a 6 milhões, são turistas estrangeiros que visitam o Brasil. Por outro lado, temos 10 milhões de brasileiros, com recursos, acostumados a viajar ao exterior que podem investir isso no turismo nacional. Esta nova tendência pode ser na verdade um meio de salvação para o setor nos próximos meses.

Vocês lançaram há 3 semanas o sistema room-office e defendem que a Accor não vai concorrer com coworkings. Mas algo que chama nossa atenção são os preços, que vão a partir de R$ 100 a diária, em um cenário de redução de gastos por parte do consumidor. O público foi receptivo?

Sim. Evidentemente, a proposta não é para todos os bolsos. Existe um custo mínimo pelo quarto, limpeza, implementação que deve ser considerado. Um quarto de hotel comum tem uma diária de R$ 250, dos quais R$ 130 são despesas do hotel. Quando criamos o room-office não olhamos para a rentabilidade, até porque com R$ 99 o Ibis não vai ganhar muito dinheiro. A proposta foi para estimular o tráfego, trazer mais pessoas que eventualmente consumam outras coisas e também uma certa inovação.

Então, room-office não é um negócio que se traduz na salvação do setor hoteleiro. Concordo com você que preço pode ser uma trava, mas estamos oferecendo um escritório, um quarto inteiro para uma pessoa e não um espaço de coworking. Sobre o coworking, acho que o mercado tem espaço e vai ter dois momentos. O primeiro é agora com a pandemia onde os coworkings devem sofrer. Mas, depois da pandemia, deve voltar, talvez com novos formatos. Se uma pessoa não quer gastar mais que R$ 40, ela vai procurar um coworking. Mas quem procura o conforto e privacidade de um escritório vai pagar mais caro. Então temos ofertas para todos os bolsos.

Você aponta que há uma previsão de reabrir 80 hotéis em junho no Brasil. Quantos devem ter room-office? O modelo continua quando a pandemia acabar?

Sim, até junho vamos reabrir 80 hotéis. Inicialmente pensamos em ter room-office em alguns hotéis, mas como o retorno está sendo muito positivo e o custo não é tão elevado, estamos avaliando implementar mais room-office nos hotéis. Queremos que toda a cidade brasileira tenha no mínimo 3 hotéis com room-offices. Para os clientes corporativos, é ainda mais simples. A Accor não tem intenção de eliminar este formato enquanto existam pedidos. Mas acreditamos que o room-office deve prevalecer no mínimo até o final de 2021.

Sobre o apoio do governo, que medidas o setor hoteleiro e a Accor está solicitando neste processo de reabertura econômica?

A indústria hoteleira foi a mais impactada, a primeira fase passou e a terceira só deve ocorrer daqui a 15 meses. Enxergamos que o mercado está otimista, as pessoas vão viajar misturando trabalho e lazer. Mas o fundamental é que o consumidor e os governos entendam que somos um setor que garanta uma arrecadação forte de taxas e impostos. Fornecemos também muito emprego. Em média 14% dos empregos do Brasil estão ligados a turismo e hotelaria. Representamos 8% do PIB.

É fundamental que o governo enxergue isso para que flexibilize três situações: 1) a medida provisória, que suspende o trabalho e reduz contratos, deve ser adiada para o turismo e hotelaria em pelo menos 120 dias. Sem isso, muitas empresas vão falir. 2) O acesso ao crédito anunciado pelo governo não chega até as pontas, estamos pedindo ajuda do governo para garantir que ocorra tudo o anunciado. Com crédito, as empresas podem ter fôlego de até 3 meses. O crédito está funcionando, mas é muito difícil ter acesso. E, por último, há custos que deveriam ser adiados, como impostos, eletricidade, água, PIS, COFINS. Dar uma carência as empresas de pelo menos 6 meses. O governo precisa ajudar o Brasil na fase crítica que é a reabertura dos hotéis desde junho até o final do ano. Só assim as empresas conseguirão chegar à 3ª fase, que é a retomada do setor e do turismo.

Fonte: Invest News

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