O recente comportamento da multinacional francesa Carrefour, de banir a carne brasileira em território francês, além de conclamar outras redes varejistas e restaurantes da França a seguirem seu exemplo, é lamentável e baseado em mentiras.
Se o Carrefour detectou alguma irregularidade sanitária, técnica ou ambiental quanto ao produto, deveria suspender a compra de carne proveniente de nosso País não apenas para abastecer suas lojas da França, mas, também, das unidades brasileiras e as da Argentina. E por que não fez isso? Porque, na verdade, não há problema algum com a carne do Brasil.
Não se trata, tampouco, do impacto negativo aos pecuaristas franceses pelo volume de carne bovina transacionada entre os dois países. Frigoríficos brasileiros venderam, para esta nação, cerca de 80 toneladas deste tipo de produto somente em 2024. Para se ter uma ideia, isto equivale ao consumo de um único dia em bares e restaurantes brasileiros. O que está ocorrendo, então?
Trata-se de uma decisão política de protecionismo, com o objetivo de agradar aos agricultores franceses (que exercem um forte lobby) e barrar o acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul. O buraco “econômico”, logo, é mais embaixo.
A recente declaração do principal executivo global do Carrefour, Alexandre Bompard, causou controvérsia, já que, em tese, alguém que ocupa este cargo não deveria basear seu discurso em falsidades sobre a sustentabilidade dos frigoríficos que operam no Brasil, o que gerou indiscutível e desnecessário desgaste nas relações com o País e prejudicou nossa imagem na Europa.
As relações internacionais são regidas pela reciprocidade. Competição é competição! E, não de hoje, a Agricultura francesa não concorre e recebe diversos incentivos governamentais. Ao tomar essa iniciativa, a gigante do varejo nem considerou que a operação brasileira representa 40% do lucro bruto global do Carrefour e que suas lojas são as maiores do ramo do Brasil.
Face aos acontecimentos, a Federação dos Hotéis, Bares e Restaurantes do Estado de São Paulo (Fhoresp), que representa mais de 500 mil estabelecimentos, tomou a atitude de organizar um boicote à rede, porque a questão envolve danos ao nosso Agronegócio – inclusive, por questionar a qualidade da proteína animal servida em restaurantes brasileiros, já que trata-se de represália ao mesmo produto.
Tivemos uma altíssima adesão à retaliação ao Carrefour e, também, a outras marcas da rede, a Sam’s Club e o Atacadão. A ação só chegou ao fim, há poucas horas, após retratação por parte do CEO global da varejista francesa.
Em tempo, uma reflexão: o Carrefour, ao pedir aos restaurantes franceses também não importarem carne brasileira, não esperava que estes estabelecimentos revendessem seus produtos por valor mais alto aos clientes? É uma conta pouco estratégica e que não fecha.
Fato é que, o clima e o Meio Ambiente, que deveriam ser causas nobres e comuns para debates internacionais, tornaram-se armas poderosas no Comércio e na Geopolítica. A disputa de mercados transformou-se num jogo de narrativas, sustentado mais por preconceitos do que por dados comprovados e por Ciência.
O Brasil detém uma das legislações mais rigorosas do mundo e atua conforme as melhores práticas internacionais. Além do mais, nossas virtudes ambientais são imensamente superiores às da França, e isso vem incomodando já algum tempo os negócios e os interesses da Europa.
Ao decidir dar início a uma guerra comercial, fingindo ser “o mocinho” de uma história mal contada e repleta de meias verdades, a rede de supermercados deveria calcular que, do outro lado, há consumidores e líderes setoriais que poderiam reagir. Desdenhou. Subestimou. Não esperava o toma-lá-da-cá legítimo, justo e balizado em argumentos consistentes, e não em fake news.
*Edson Pinto é presidente do SinHoRes Osasco – Alphaville e Região, diretor-executivo da FHORESP; mestre em Direito, pela Pontifícia Universidade Católica (PUC); e autor do livro “Lavagem de Capitais e Paraísos Fiscais” (Editora Atlas).
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